São os filhos do deserto onde a terra esposa a luz

Olá, tudo bem?

                 O exercício é sobre interpretação de texto

Interpretar um texto é entender seu objetivo, é saber o que o autor queria dizer quando o escreveu, é falar o que entendemos sobre ele.

O Navio Negreiro, de Castro Alves, faz parte da geração condoreira do movimento romântico.

                               Vamos ao exercício

Essa é uma das estrofes do poema “O Navio Negreiro”, do poeta baiano Castro Alves, escrito em 1869. Considerando que a lei Eusébio de Queiroz, que proibiu o tráfico negreiro transatlântico, foi promulgada em 1850, Castro Alves, que apoiava a causa abolicionista, teria escrito esse poema dezenove anos depois da referida lei, com o objetivo de:

*

a) Impedir a revogação da lei que proibiu o tráfico transatlântico de negros africanos.

ERRADA. O poeta era a favor desta lei.

b) Abolir a escravidão, ao menos, na região onde nasceu, a Bahia.

ERRADA. Queria aboli-la no Brasil inteiro.

c) Persuadir intelectuais que eram seus contemporâneos a aderirem à causa abolicionista, como Joaquim Nabuco, que era escravocrata.

ERRADA. A linguagem, na época, era para o povo em geral.

d) dramatizar em versos o sofrimento dos negros africanos no momento em que tiveram que sair de sua terra em direção ao Brasil, transportados nos porões dos navios negreiros, para contribuir assim com a luta pelo fim da escravidão.

CORRETA. O poema inteiro narra como era a vida num Navio Negreiro em comparação com a vida livre que levavam antes da escravidão.

e) Apenas preservar a memória do sofrimento dos negros, pois, em 1869, o Brasil já havia abolido a escravidão

ERRADO. O Brasil ainda não tinha abolido a  escravidão, isto só ocorreu em 1888.

Saiba mais sobre a escravidão no Brasil, acesse aqui:

Sucesso nos estudos!!!


São os filhos do deserto onde a terra esposa a luz

O Navio Negreiro é uma poesia de Castro Alves que integra um grande poema épico chamado Os Escravos.

Escrita em 1870 na cidade de São Paulo, a poesia relata a situação sofrida pelos africanos vítimas do trafico de escravos nas viagens de navio da África para o Brasil. Ela é dividida em seis partes com metrificação variada.

O Navio Negreiro é uma poesia dividida em seis partes e se encontra dentro da obra Os Escravos. Sua metrificação é variada e acompanha o tema que se segue no texto. Isso dá um efeito para a poesia de unidade entre a forma e o conteúdo.

O céu e o mar como infinitos que se aproximam tanto pela cor azul como pelo amplo espaço são os lugares centrais da poesia. No meio dessa infinitude é que se encontra o barco, que navega com o vento e com o esforço dos homens queimados de sol.

Bem feliz quem ali pode nest'hora Sentir deste painel a majestade! Embaixo — o mar em cima — o firmamento...

E no mar e no céu — a imensidade!

O poeta observa essa cena com amor e com simpatia pela travessia poética do barco. Ele quer se aproximar do navio que cruza o mar, mas o navio foge do escritor.

O poeta começa a imaginar de que nação é aquele barco que segue em alto-mar. Mas, na realidade, isso não faz muita diferença. Todo navio no oceano é cheio de poesia e de saudades. Cada nação tem um canto diferente: os espanhóis se lembram das belas mulheres da Andaluzia e os gregos dos cantos de Homero.

Que importa do nauta o berço, Donde é filho, qual seu lar? Ama a cadência do verso Que lhe ensina o velho mar! Cantai! que a morte é divina! Resvala o brigue à bolina Como golfinho veloz. Presa ao mastro da mezena Saudosa bandeira acena

As vagas que deixa após.

Através dos olhos do Albatroz, o poeta consegue se aproximar do navio e observar o que acontece lá. Para a sua surpresa o canto não é de saudades ou de poesia, mas sim um canto fúnebre e o que se vê no navio é vil.

Desce do espaço imenso, ó águia do oceano! Desce mais ... inda mais... não pode olhar humano Como o teu mergulhar no brigue voador! Mas que vejo eu aí... Que quadro d'amarguras! É canto funeral! ... Que tétricas figuras! ...

Que cena infame e vil... Meu Deus! Meu Deus! Que horror!

O poeta descreve a horrível cena que se passa no convés do navio: uma multidão de negros, mulheres, velhos e crianças, todos presos uns aos outros, dançam enquanto são chicoteados pelos marinheiros. A descrição é longa, feita em seis estrofes.

As principais imagens são as dos ferros que rangem formando uma espécie de música e da orquestra de marinheiros que chicoteiam os escravos. A relação entre a música e a dança com a tortura e o sofrimento dão uma grande carga poética à descrição da cena. No final quem ri da dança insólita é o próprio Satanás, como se aquele fosse um show de horrores feito para o diabo.

E ri-se a orquestra irônica, estridente. . . E da ronda fantástica a serpente Faz doudas espirais... Qual um sonho dantesco as sombras voam!... Gritos, ais, maldições, preces ressoam!

E ri-se Satanás!...

O poeta mostra a sua indignação perante o navio negreiro e roga à Deus e à fúria do mar para que acabe tal infâmia. A primeira estrofe é repetida no final, como se o pedido fosse reforçado pelo poeta.

Senhor Deus dos desgraçados! Dizei-me vós, Senhor Deus, Se eu deliro... ou se é verdade Tanto horror perante os céus?!... Ó mar, por que não apagas Co'a esponja de tuas vagas Do teu manto este borrão? Astros! noites! tempestades! Rolai das imensidades!

Varrei os mares, tufão! ...

No meio da quinta parte, as imagens da liberdade no continente africano são intercaladas com a prisão no navio negreiro. A noite escura e aberta da savana se transforma num porão escuro, cheio de doenças e de morte. As condições desumanas do transporte de escravos são descritas de forma poética, realçando a desumanização deles.

O poeta questiona qual a bandeira que hasteada nesse navio é a responsável por tal barbaridade. É uma retomada da segunda parte do poema. Se antes a bandeira não importava, pois o que se ouvia era a poesia e o canto, agora ela é essencial diante do sofrimento que o navio carrega.

O que se vê hasteada é a bandeira do Brasil, pátria do poeta. O sentimento de desapontamento é grande, ele realça as qualidades do seu país, a luta pela liberdade e toda a esperança que reside na nação e que agora é manchada pelo tráfico de escravos.

Auriverde pendão de minha terra, Que a brisa do Brasil beija e balança, Estandarte que a luz do sol encerra E as promessas divinas da esperança... Tu que, da liberdade após a guerra, Foste hasteado dos heróis na lança Antes te houvessem roto na batalha,

Que servires a um povo de mortalha!...

O poema de Castro Alves é uma pequena narrativa sobre o tráfico de escravos entre a África e o Brasil. O elemento poético reside nas imagens e nas metáforas encontradas ao longo do poema, principalmente na quarta parte, onde a tortura dos escravos é descrita.

A beleza e a infinitude do mar e do céu são colocadas em cheque com a barbárie e a falta de liberdade nos porões do navio negreiro. Como se fosse incompatível toda a beleza do oceano com a escuridão que se passa no navio. Uma das características do poema é o universalismo. Quando a viagem é feita pela aventura ou pelo comércio, as bandeiras e as nações não são importantes. Elas só se tornam relevantes quando o objetivo da navegação é cruel.

A crítica do tráfico de escravos não impede o patriotismo do poeta. É o seu patriotismo que leva à crítica. A sua visão do Brasil como um lugar de liberdade e do futuro é incompatível com a escravidão. Mesmo sendo um liberal, Castro Alves não deixa de lado a religiosidade, clamando a Deus uma intervenção divina no tráfico negreiro.

Castro Alves é um dos maiores poetas da terceira geração romântica, também conhecida como geração Condor. Conhecido como o "único poeta social do Brasil", sua obra atingiu fama e reconhecimento pela crítica. Seu principal livro, Espumas flutuantes, foi o único publicado em vida e responsável pelo resgate de suas outras obras.

Inspirado pela poesia de Victor Hugo, Castro Alves tomou parte nas questões sociais, principalmente em relação à escravidão. O combate ao sistema escravagista rendeu ao escritor a alcunha de "Poeta dos Escravos". O pensamento liberal do final do século XIX e o movimento abolicionista também foram grandes influências para o poeta.

O abolicionismo foi um movimento contra a escravatura e o tráfico de escravos que veio do pensamento Iluminista. Socialmente a questão tinha relação com a declaração universal dos diretos dos homens. O Iluminismo foi um pensamento responsável pelos novos conceitos de liberdade e igualdade, que moveu algumas das revoluções mais importantes do século XIX. Para além da revolução social, o avanço da industrialização também mudou a visão da economia no mundo.

Os escravos não eram consumidores e a produção industrial na cidade gerava mais riquezas que a produção escrava nas plantações. Para as indústrias, os escravos eram consumidores em potencial se se tornassem livres, e esse foi um dos incetivos econômicos para o movimento abolicionista.

I

'Stamos em pleno mar... Doudo no espaço Brinca o luar — dourada borboleta; E as vagas após ele correm... cansam

Como turba de infantes inquieta.

'Stamos em pleno mar... Do firmamento Os astros saltam como espumas de ouro... O mar em troca acende as ardentias,

— Constelações do líquido tesouro...

'Stamos em pleno mar... Dois infinitos Ali se estreitam num abraço insano, Azuis, dourados, plácidos, sublimes...

Qual dos dous é o céu? qual o oceano?...

'Stamos em pleno mar. . . Abrindo as velas Ao quente arfar das virações marinhas, Veleiro brigue corre à flor dos mares,

Como roçam na vaga as andorinhas...

Donde vem? onde vai? Das naus errantes Quem sabe o rumo se é tão grande o espaço? Neste saara os corcéis o pó levantam,

Galopam, voam, mas não deixam traço.

Bem feliz quem ali pode nest'hora Sentir deste painel a majestade! Embaixo — o mar em cima — o firmamento...

E no mar e no céu — a imensidade!

Oh! que doce harmonia traz-me a brisa! Que música suave ao longe soa! Meu Deus! como é sublime um canto ardente

Pelas vagas sem fim boiando à toa!

Homens do mar! ó rudes marinheiros, Tostados pelo sol dos quatro mundos! Crianças que a procela acalentara

No berço destes pélagos profundos!

Esperai! esperai! deixai que eu beba Esta selvagem, livre poesia Orquestra — é o mar, que ruge pela proa, E o vento, que nas cordas assobia...

..........................................................

Por que foges assim, barco ligeiro? Por que foges do pávido poeta? Oh! quem me dera acompanhar-te a esteira

Que semelha no mar — doudo cometa!

Albatroz! Albatroz! águia do oceano, Tu que dormes das nuvens entre as gazas, Sacode as penas, Leviathan do espaço,

Albatroz! Albatroz! dá-me estas asas.

II

Que importa do nauta o berço, Donde é filho, qual seu lar? Ama a cadência do verso Que lhe ensina o velho mar! Cantai! que a morte é divina! Resvala o brigue à bolina Como golfinho veloz. Presa ao mastro da mezena Saudosa bandeira acena

As vagas que deixa após.

Do Espanhol as cantilenas Requebradas de langor, Lembram as moças morenas, As andaluzas em flor! Da Itália o filho indolente Canta Veneza dormente, — Terra de amor e traição, Ou do golfo no regaço Relembra os versos de Tasso,

Junto às lavas do vulcão!

O Inglês — marinheiro frio, Que ao nascer no mar se achou, (Porque a Inglaterra é um navio, Que Deus na Mancha ancorou), Rijo entoa pátrias glórias, Lembrando, orgulhoso, histórias De Nelson e de Aboukir.. . O Francês — predestinado — Canta os louros do passado

E os loureiros do porvir!

Os marinheiros Helenos, Que a vaga jônia criou, Belos piratas morenos Do mar que Ulisses cortou, Homens que Fídias talhara, Vão cantando em noite clara Versos que Homero gemeu ... Nautas de todas as plagas, Vós sabeis achar nas vagas

As melodias do céu! ...

III

Desce do espaço imenso, ó águia do oceano! Desce mais ... inda mais... não pode olhar humano Como o teu mergulhar no brigue voador! Mas que vejo eu aí... Que quadro d'amarguras! É canto funeral! ... Que tétricas figuras! ...

Que cena infame e vil... Meu Deus! Meu Deus! Que horror!

IV

Era um sonho dantesco... o tombadilho Que das luzernas avermelha o brilho. Em sangue a se banhar. Tinir de ferros... estalar de açoite... Legiões de homens negros como a noite,

Horrendos a dançar...

Negras mulheres, suspendendo às tetas Magras crianças, cujas bocas pretas Rega o sangue das mães: Outras moças, mas nuas e espantadas, No turbilhão de espectros arrastadas,

Em ânsia e mágoa vãs!

E ri-se a orquestra irônica, estridente... E da ronda fantástica a serpente Faz doudas espirais ... Se o velho arqueja, se no chão resvala, Ouvem-se gritos... o chicote estala.

E voam mais e mais...

Presa nos elos de uma só cadeia, A multidão faminta cambaleia, E chora e dança ali! Um de raiva delira, outro enlouquece, Outro, que martírios embrutece,

Cantando, geme e ri!

No entanto o capitão manda a manobra, E após fitando o céu que se desdobra, Tão puro sobre o mar, Diz do fumo entre os densos nevoeiros: "Vibrai rijo o chicote, marinheiros!

Fazei-os mais dançar!..."

E ri-se a orquestra irônica, estridente. . . E da ronda fantástica a serpente Faz doudas espirais... Qual um sonho dantesco as sombras voam!... Gritos, ais, maldições, preces ressoam!

E ri-se Satanás!...

V

Senhor Deus dos desgraçados! Dizei-me vós, Senhor Deus! Se é loucura... se é verdade Tanto horror perante os céus?! Ó mar, por que não apagas Co'a esponja de tuas vagas De teu manto este borrão?... Astros! noites! tempestades! Rolai das imensidades!

Varrei os mares, tufão!

Quem são estes desgraçados Que não encontram em vós Mais que o rir calmo da turba Que excita a fúria do algoz? Quem são? Se a estrela se cala, Se a vaga à pressa resvala Como um cúmplice fugaz, Perante a noite confusa... Dize-o tu, severa Musa,

Musa libérrima, audaz!...

São os filhos do deserto, Onde a terra esposa a luz. Onde vive em campo aberto A tribo dos homens nus... São os guerreiros ousados Que com os tigres mosqueados Combatem na solidão. Ontem simples, fortes, bravos. Hoje míseros escravos,

Sem luz, sem ar, sem razão. . .

São mulheres desgraçadas, Como Agar o foi também. Que sedentas, alquebradas, De longe... bem longe vêm... Trazendo com tíbios passos, Filhos e algemas nos braços, N'alma — lágrimas e fel... Como Agar sofrendo tanto, Que nem o leite de pranto

Têm que dar para Ismael.

Lá nas areias infindas, Das palmeiras no país, Nasceram crianças lindas, Viveram moças gentis... Passa um dia a caravana, Quando a virgem na cabana Cisma da noite nos véus ... ... Adeus, ó choça do monte, ... Adeus, palmeiras da fonte!...

... Adeus, amores... adeus!...

Depois, o areal extenso... Depois, o oceano de pó. Depois no horizonte imenso Desertos... desertos só... E a fome, o cansaço, a sede... Ai! quanto infeliz que cede, E cai p'ra não mais s'erguer!... Vaga um lugar na cadeia, Mas o chacal sobre a areia

Acha um corpo que roer.

Ontem a Serra Leoa, A guerra, a caça ao leão, O sono dormido à toa Sob as tendas d'amplidão! Hoje... o porão negro, fundo, Infecto, apertado, imundo, Tendo a peste por jaguar... E o sono sempre cortado Pelo arranco de um finado,

E o baque de um corpo ao mar...

Ontem plena liberdade, A vontade por poder... Hoje... cúm'lo de maldade, Nem são livres p'ra morrer. . Prende-os a mesma corrente — Férrea, lúgubre serpente — Nas roscas da escravidão. E assim zombando da morte, Dança a lúgubre coorte

Ao som do açoute... Irrisão!...

Senhor Deus dos desgraçados! Dizei-me vós, Senhor Deus, Se eu deliro... ou se é verdade Tanto horror perante os céus?!... Ó mar, por que não apagas Co'a esponja de tuas vagas Do teu manto este borrão? Astros! noites! tempestades! Rolai das imensidades!

Varrei os mares, tufão! ...

VI

Existe um povo que a bandeira empresta P'ra cobrir tanta infâmia e cobardia!... E deixa-a transformar-se nessa festa Em manto impuro de bacante fria!... Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta, Que impudente na gávea tripudia? Silêncio. Musa... chora, e chora tanto

Que o pavilhão se lave no teu pranto! ...

Auriverde pendão de minha terra, Que a brisa do Brasil beija e balança, Estandarte que a luz do sol encerra E as promessas divinas da esperança... Tu que, da liberdade após a guerra, Foste hasteado dos heróis na lança Antes te houvessem roto na batalha,

Que servires a um povo de mortalha!...

Fatalidade atroz que a mente esmaga! Extingue nesta hora o brigue imundo O trilho que Colombo abriu nas vagas, Como um íris no pélago profundo! Mas é infâmia demais! ... Da etérea plaga Levantai-vos, heróis do Novo Mundo! Andrada! arranca esse pendão dos ares!

Colombo! fecha a porta dos teus mares!